Opinião | Vitória na corte do “rei” Arthur?

Imagem: reprodução

Para quem gosta de futebol, quando o tema é muito importante, o Congresso Nacional funciona como o regulamento da Copa do Brasil: jogos de ida, em casa, e de volta, no estádio do concorrente. No primeiro caso, a Câmara dos Deputados aprovou por 372 votos o novo arcabouço fiscal, ou seja, as regras sobre como o governo vai arrecadar e gastar dinheiro.  

Para a surpresa de alguns, o PL contribuiu com 30 votos a favor da proposta governista e, provando que não existe toda essa unidade na esquerda, os 12 deputados do PSOL votaram contra, além de Túlio Gadelha, o único parlamentar da Rede, partido da ministra Marina Silva, que também foi contra. Deve-se lembrar que existe sempre a questão eleitoral: se esses 13 votos fossem necessários para a provação, obviamente PSOL e Rede teriam votado a favor, apesar de suas eternas ressalvas em relação ao PT. Porém, como o placar já era mais do que o suficiente, seus votos contra serviram para reafirmar seus discursos para o público fiel. Coisas que sempre existiram na política e que foram aprofundadas pelas redes sociais.

Enfim, como o “jogo de ida” foi ganho com folga, provavelmente não haverá surpresa no de volta, no Senado. Provavelmente, a nova regra fiscal sofrerá mais algumas alterações, mas deve ser aprovada porque algo tem que regular as contas do governo, o caos econômico não interessa a ninguém e porque o plano é, no mínimo, funcional. 

Segue o jogo!

Após a votação expressiva conquistada por deputados e senadores conservadores, ao fim das eleições do ano passado, até os otimistas tinham dúvidas sobre o futuro de Lula. Em outubro de 2022, jamais se pensaria que a PEC da Transição fosse aprovada tão rápido e, muito menos, que a nova regra fiscal seria aprovada com folga. Mérito da articulação política do governo, principalmente, com o “dono da bola” na atualidade, o presidente da Câmara, Arthur Lira. No caso, alguém que tem grande influência nos partidos do centro, o que não significa apenas parlamentares folclóricos e partidos inexpressivos, mas siglas importantes como MDB, União Brasil e PSD. E como nenhum governo aprova nada sem o centro, tudo isso é uma questão de racionalidade: em política não é necessário ser amigo, mas para que ser inimigo, não é? 

Há quem tenha se espantado com os 30 votos do PL para a aprovação, mas isso é natural e não tem nada de errado aí. O deputado no qual você votou tem que dialogar com o deputado eleito por quem pensa de maneira muito diferente da sua. Lula é o presidente de 50,9% dos eleitores, mas e dos outros? Políticos não lidam com o Congresso Nacional ideal, e para atender às demandas do bairro de cada eleitor, têm que dialogar com os outros parlamentares. Os mais inteligentes dão um passo para trás aqui, um para o lado ali, e se tiver habilidade mesmo, quando for possível, dois passos mais à frente. 

No meio disso tudo, para o ministro Fernando Haddad a comemoração é natural, mas também uma forma de ressaltar os resultados de seu trabalho, que obviamente visam a faixa presidencial. Porém, o drama ainda não acabou: caso seja realmente confirmada a aprovação do novo arcabouço fiscal, abre-se o caminho para uma luta de décadas, a reforma tributária. Se fosse um campeonato, essa seria a final.

Então, voltamos à situação em que até o mais otimista olha com desconfiança, porque, nesse caso, como pode andar uma discussão em que todo mundo só aceita ganhar? Pois é, tudo isso não é futebol, mas é tocar a bola pra frente e segue o jogo.

Fernando Ringel, jornalista e professor universitário.

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