Opinião: outro abril despedaçado

Imagem: reprodução

Abril despedaçado é o título de um filme do cineasta brasileiro Walter Salles. Narrado por “Pacu,” o filho caçula dos Breves, relata a contenda entre a família dele e os Ferreira. A história acontece no início do século XX em Riacho das Almas, uma cidade fictícia no sertão nordestino. O narrador do filme, percebe que a cultura de conflito das famílias e a tradição de vinganças e mortes assemelha-se com o movimento da bolandeira do engenho de açúcar da sua família.

O instrumento de moenda da cana torna-se uma metáfora crítica da cultura arcaica e patriarcal, que mantém as famílias presas a uma vida sem sentido, refém uma cultura de morte e violência. Em Riacho das Almas, o assassinato do filho mais velho da família rival é saudado por questão de honra.

Abril de dois mil e vinte e um termina nesta semana. O mês ficará marcado por ser o pior em números de mortes de brasileiros por Covid. Já são mais de 67 mil brasileiros que nos deixaram este mês por conta da peste.  Desde que começou a penumbra já somam 400 mil. Nos quatro primeiros meses deste ano, já morreram mais brasileiros de Covid que em todo ano de 2020.  Especialistas já falam que até junho, chegaremos a meio milhão de vítimas.

Para além do trama pessoal do narrador, o filme de Walter Salles mostra um país preso em uma estrutura política arcaica, onde e explicação do mundo e dos dilemas é fundado na tradição e em discursos religiosos falsos. O resultado pode ser resumido em uma frase de Pacu “aqui é olho por olho, olho de um por olho de outro, acabou que todo mundo ficou cego, quem tem um olho, todo mundo acha que é doido”

A Covid 19 chegou em terras tupiniquins em janeiro de 2020, porém nos encontrou presos em uma espiral política que glorifica a morte, as armas, o rancor e a vingança. Não é tarde lembrar quem no início deste ano Bolsonaro publicou um decreto ampliando o acesso a armas para a população, mas até hoje, não sabemos quando toda a população será vacinada. Graças a uma intervenção do STF, nesta derradeira semana abril, o Senado Federal iniciou uma CPI para investigar as ações e as omissões governamentais no enfrentamento da pandemia. Na sessão de abertura, velhos coronéis e novos milicianos digladiaram-se com palavras em uma batalha política já previamente determinada. Na guerra política já sabemos quem vai morrer e quem irá sobreviver.

No meio do mês, quando no pior dia, a cada 20 segundos o vírus era letal para um brasileiro, nosso presidente vai a um programa de televisão e faz piada com o jargão “CPF cancelado”. Na vida real, os números da peste parecem apenas dados em uma tabela fria. Assistimos todos os dias as vítimas crescerem em um movimento repetitivo de banalização da morte, uma lógica prisioneira a um Brasil arcaico que insiste no esvaziamento de sentido das vidas. As vítimas do Covid são avós, pais, filhos, irmãos, sogros, netos, amores e amigos. Mas isso não importa, o importante é que a bolandeira não pare.

4 Comentário

  1. Que festa hein???…e o povo morrendo…Que legal??…Mais do mesmo…Parabéns Genocidas, vocês são um verdadeiro exemplo de cidadania e patriotismo…Vocês não tem moral nenhuma para querer denigrir a turma do PT…que por sua vez também são um péssimo exemplo…porem vocês bolsonarista já se superaram…VAYA CON DIOS

  2. Utilizam uma foto que foi efetuada com um sentido para utilizá-la com outro sentido .
    Ninguém denigre o PT , não precisa , seus próprios membros fazem isto com muita expertise .
    Vaya con Dios , sim , vão para a Venezuela , Equador , Colômbia , Chile , não eram os comandantes do PT que falavam e apoiavam abertamente os governantes destes países ?
    A memória ficou curta ?

  3. Quem não assiste a globolixo como eu, sabe muito bem que essa foto com cartão do CPF Cancelado faz alusão aos bandidos que são mortos, ou pela policia ou pelo cidadão de bem que se defende e defende o seu patrimônio, chega a dar nojo ver mais um dito colunista social,usar uma foto e contextuar outra. Bom mesmo se tivesse o PT no governo, dai sim, a mortandade de pessoas iria ser bem maior, lembrem-se que eles diziam que Copa do Mundo não se faz com Hospitais e sim com estádios, agora querem culpar o melhor Presidente que este país já teve, isso só pode ser brincadeira…vão para pqp…

  4. Entendo que todos os governos possuem dificuldades concretas para exercerem suas funções, mas não me parece digno de defesa um governo que “glorifica a morte, as armas, o rancor e a vingança”.
    Obrigada, Prof. Josué, pelo texto lúcido e sensível.

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