Opinião | Entre armas e incoerências: a dualidade da segurança em Blumenau

Foto: reprodução

“Você deve aplicar, uma vez por todas, um único padrão de vida, e deve regular toda a sua vida de acordo com este padrão”. Com o olhar distante, contemplando as águas que nem sempre correm serenas por Blumenau, o estoico Sêneca, se existisse nos dias de hoje, teria dificuldades para compreender o comportamento da pitoresca cidade do Vale do Itajaí. A arquitetura, que enaltece tempos passados, também ergue-se como um cenário de incoerências, refletindo o que não pode ser ignorado. Os discursos e as opiniões divergem e tencionam as discussões, as contradições ganham o fervor e, sem avançar, a população fica refém de uma lentidão de suas próprias “não escolhas”. Estica a defesa pelo armamento da população e, também, a resistência à implantação de uma guarda municipal armada.

No decorrer desta semana, o Supremo Tribunal Federal concluiu um julgamento que deve ecoar pelos cantos da colônia. Com o voto decisivo do ministro Cristiano Zanin foi reconhecido que as guardas municipais são parte indissociável do sistema de proteção da sociedade. Ou seja, peça vital no tabuleiro da segurança pública. A decisão veio depois de uma provocação Associação dos Guardas Municipais pedindo o reconhecimento para o exercício das suas funções atribuídas ao cargo. É um sopro de respeito e responsabilidade, mas também um calar de tempestades que pairavam sobre a legitimidade de suas ações.

E, com isso, voltamos para a lembrança dos nossos enigmas locais, as polêmicas que assolam as mentes pensantes em Blumenau. A cidade, que cultua a tradição e parece abraçar os velhos tempos com saudosismo, exibe paradoxos que desafiam a lógica. Como entender a celebração do armamento da população – e o reconhecimento, no voto, dos políticos armamentistas – e esta resistência à presença de uma guarda municipal formada para ir além do monitoramento e fiscalização de trânsito?

As raízes históricas da nossa GMT remontam à década de 1940, a mais antiga do Brasil. Desde então, a corporação é uma testemunha silenciosa das transformações que varreram o país. No entanto, hoje, com suas fileiras de cerca de 130 agentes, ainda luta para ganhar parceiros na defesa das praças, escolas e demais patrimônios municipais.
Mas, nossa a dualidade persiste e vai além. Anualmente um bom tanto de milhões são destinados, por exemplo, à segurança privada nas escolas, confiando armas a estranhos, enquanto se nega investimento em servidores públicos, agentes de Estado. Uma orquestra dissonante, onde a melodia da segurança é tocada por mãos distintas e, por vezes, contraditórias.

Ao mesmo tempo em que o estandarte de tiro é erguido, a resistência à guarda municipal armada prevalece. Será que essa “teimosia” provém da intrincada teia de interesses políticos? Ou será uma visão distorcida da segurança, onde o medo da tirania da força pública turva a compreensão de que o guarda municipal, bem treinado e equipado, é um aliado, não um opressor?

Dentro deste teatro das contradições blumenauenses, a sinfonia da segurança é composta por acordes que se desencontram no palco. Por isso, a decisão do STF pode chegar como o movimento de um maestro que afina uma orquestra. Que a voz do reconhecimento a guarda municipal ecoe mais alto, vencendo as incoerências que a cidade precisa enfrentar para buscar, unida, um equilíbrio que celebre a proteção, a tradição e o bem-estar de todos. Assim, será possível estender a qualidade de vida aos mais distantes e esquecidos recantos da cidade, ampliando também a sensação de segurança para o cidadão.

Tarciso Souza, jornalista e empresário

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