Opinião | Em tempos “covidianos”, máscara e álcool não bastam

Foto: reprodução

Segunda feira, oito de fevereiro de dois mil e vinte um, em uma escola pública de Blumenau, um menino deu uma corridinha, fez o sinal da cruz e no final do gesto beijou a mão – o típico mandar beijo pra Jesus. Depois, pulou o trilho do portão, pisou o pátio da escola, primeiro com o pé direito, e tocou no pátio com a mão. A cena lembrava um jogador de futebol entrando em campo. No rosto, uma máscara de proteção, que estampava o escudo do time do coração, deixava de fora apenas olhos, sobressaltados.

O dia marcava o retorno das aulas presenciais nas escolas públicas municipais, realidade prevista para ocorrer na rede estadual no próximo dia dezoito de fevereiro. Nosso estudante aparentava ter entre onze ou doze anos de idade, sendo assim, deve estar entre o sexto ou sétimo ano do ensino fundamental. Nesta fase, os estudantes aprendem sobre os vírus e outros microrganismos, bem como as formas de contágios e prevenção. 

Nesta fase também é ensinado sobre a importância das vacinas, a história das pesquisas e o desenvolvimento dos imunizantes. Como elas agem no organismo e formam anticorpos etc. Nosso estudante também vai aprender que os imunizantes não tem possibilidades de alterar o DNA (Ácido desoxirribonucleico), pois a nova geração de vacinas contém um traço, pequena parte do vírus, formado por RNA (Ácido ribonucleico) que age dentro de uma determinada região das células produzindo proteínas virais que serão expostas na superfície da célula desencadeando no organismo os anticorpos necessários contra o COVID-19. 

A escola que ele encontrou, e que os estudantes da rede estadual irão encontrar na próxima semana, será a mesma que deixaram em março de dois mil e vinte. Neste quase um ano de aulas remotas não se viu nenhuma obra de ampliação e melhorias das estruturas das escolas. Mudará a dinâmica da aula. No ensino médio e anos finais do ensino fundamental, aula presencial mesmo, apenas a cada quinzena; em turmas maiores como no ensino médio, há casos em que a previsão de encontros presenciais com professor seja de apenas uma vez por mês. Isso claro, se não houver um feriado no meio. Na educação infantil e nas turmas de ensino fundamental 1 esse hiato de aulas presenciais diminui para uma quinzena. O que não muda a realidade, pois não melhora a relação pedagógica e nem mesmo alivia a condição dos pais que não tem um lugar seguro para deixar seus filhos. 

O fato é que, em Santa Catarina, o retorno das aulas presenciais está ocorrendo por conta de uma medida aventureira patrocinada pela Assembleia Legislativa do Estado. A “casa do povo”, não obstante as orientações das autoridades sanitárias e de educação, transformou a educação em serviço essencial, ignorou a ciência e deu vazão a negacionistas e propagadores do senso comum.  O resultado é esperado: improviso e a falta de planejamento são o imperativo. Álcool gel e máscaras caseiras serão as únicas armas que professores e estudantes terão para enfrentar a peste. 

É preciso lembrar que neste país temos um presidente que passou a pandemia inteira negando a existência do vírus e militando contra a vacina. Conhecimento elementar que até nossos estudantes de ensino fundamental sabem não ser verdadeiro.  Acrescente-se ainda a perseguição ao conhecimento científico e aos professores, e a alegação de nada poder fazer para combater a epidemia porque o país supostamente estaria quebrado. Ainda que tenha gastado 6,2 bilhões de reais para se aliar ao centrão e impedir seu impeachment. 

Por aqui, em Santa Catarina, temos um governador que, também para se manter no poder, lançou-se em negociatas com o legislativo – poder que agora empurra professores e estudantes para se aglomerarem sem vacinas e sem equipamentos de proteção necessários. Trata-se da mesma casa que, há poucos dias, livrou da cadeia seu presidente, réu em um processo que apura desvios que ultrapassam R$ 50 milhões – dinheiro esse que era desviado do plano de saúde dos professores estaduais. 

A cena do estudante pedindo proteção divina e repetindo rituais populares que lembram um jogador de futebol demonstra que a região do país que se aventa como a Europa brasileira é, na verdade, um recorte do que temos em terras tupiniquins. Na terra onde a ciência não está ao alcance de todos, e a educação realizada sob improvisos e intervenções politiqueiras, resta aos nossos jovens pedir proteção aos deuses e sonhar em um dia ser um jogador de futebol. Assim, talvez tenha um futuro melhor. 

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