Opinião | Momento Fabiano

Foto: reprodução

Fabiano é um personagem do Vidas Secas de Graciliano Ramos. Machista, durão, fruto do meio de seca e pobreza que vive, é cercado de medo e incertezas. Isso porque é na verdade um frouxo, analfabeto e depende da esposa para atividades básicas como fazer contas.  Recorro a este personagem porque, os conservadores de Blumenau estão agitados.  No último dia 20 de Abril do quarto ano do mandato do Messias, por unanimidade, os desembargadores do Tribunal de Justiça de Santa Catarina votaram pelo fim da obrigatoriedade da leitura da bíblia nas sessões da Câmara de Vereadores de Blumenau. Sim, o TJSC, com o voto de mais de 20 juízes, decidiram que o momento bíblico é inconstitucional. Parece que a Ministra Damares Alves errou as contas, não é só um diabo careca no STF, tem mais uma turminha aqui em Santa Catarina.  Tem até vereador lacrando na internet contra o tribunal.

A decisão é a reposta a uma ação direta de inconstitucionalidade do Ministério Público Estadual. A prática que começou em 2010 e consiste que no início de cada sessão, um dos nossos valorosos edis escolhem livremente um texto bíblico para ler na tribuna. A escolha do texto não tem muito critério. Pelo que consultei com nossos vereadores, há uma escala, que é seguida conforme a presença em plenário. O ritual segue com os vereadores que estão no plenário, se quem está na escala está presente, lê um trecho aleatório do texto sagrado.  Para quem já assistiu uma seção da casa, percebeu que durante a leitura normalmente ninguém presta atenção, também ninguém explica nada daquilo. Um ritual sem sentido. Uma espécie de analfabetismo funcional bíblico. Lembra um pouco o Fabiano, personagem de Vidas Secas.

A decisão fundamenta-se no fato que “não pode o legislativo municipal impor a leitura do livro sagrado de uma religião em detrimento de todas as outras e que a prática não se coaduna com os princípios da laicidade do Estado e da liberdade religiosa e vão de encontro aos princípios da isonomia e da impessoalidade”. Ou seja, se o estado é laico, não pode privilegiar uma religião apenas.

Porém a preocupação dos conservadores deve ser por outro motivo. Sem a leitura displicente do texto sagrado, corre risco que daqui pra frente algum de nossos vereadores passem a defender temas estranhos a cristandade. Que professor deve andar armado; a ditadura militar e as torturas cometidas no período. Defender o presidente apaixonado pela torturador; que criança não precisam ser vacinadas. Podem realizar uma audiência pública negacionista.  Aumentar a idade de aposentadoria de professores e médicos. Retirar direitos trabalhistas de servidores  justificando falta de recurso no orçamento e no mesmo ano promover doações milionárias para empresa de ônibus; Votar pelo aumento na taxa de esgoto que já é privatizado, boicotar um CPI para fiscalizar contratos milionários. Estamos correndo riscos…


2 Comentário

  1. Parabéns pelo texto, professor Josué, que mesmo com nome bíblico sabe distinguir entre fé, religiâo e os poderes constituídos numa democracia. Democracia que mesmo falha e altamente atacada nesse momento histórico e obscuro em que vivemos, ainda prevê que o Estado e seus poderes são laicos. Parabéns aos desembargadores por sua lucidez.

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*