Opinião: bem-aventurados os pacificadores

Imagem: reprodução

Na semana passada a crônica política local andou agitada. Tudo por conta de um discurso de um vereador da cidade. “Eu sonho com o dia que pelo menos uns dez professores possam ter o porte de armas.” A frase foi proferida na tribuna da Câmara de Vereadores de Blumenau. O autor, um vereador evangélico herdeiro de genealogia político-religiosa, produziu em Blumenau um fenômeno interessante. Ex-assessores que se tornaram vereadores e, ao assumirem o mandato, passaram a disputar poder com o político que os pariu. Poderíamos chamá-los de Zero Um, Zero Dois e Zero Três.

Por mais que pareça um arrombo político, a afirmação não é isolada e muito menos impensada. O autor da frase está em seu terceiro mandato de vereador e segundo as informações do noticiário de política, se prepara para disputar o cargo de deputado estadual nas eleições de 2022. Para tanto, aproxima-se do bolsonarismo e da extrema direita. A confusão cognitiva do discurso já revela isso! Na data do discurso na plateia da câmara de vereadores, era majoritariamente de militares que acompanhavam o novo comandante da polícia militar da cidade.

Para além da estratégia política, a fala do vereador também revela qual sociedade ele pretende construir. Um lugar de desconfiança, violência e medo.  O discurso do dia 07 não é novidade.  Nem pra ele, ou mesmo, para a trinca de vereadores evangélicos. A atuação política do Zero dois pode ser resumida por tentativas de censuras a professores e estudantes de escolas públicas.  Sua atuação na câmara de vereadores em relação a educação resume-se a defender a ideia de que a escola e a educação atuam em oposição às famílias e por isso devem ser combatidos. Promove verdadeiras invasões nas escolas e em nome da sua crença religiosa busca censurar trabalhos escolares de adolescentes e aulas de professores.

Foi durante seu mandato de presidente do legislativo que tramitou o Projeto de Lei Complementar nº 1.827, de autoria do Poder Executivo, que alterou a forma de contratação dos trabalhadores admitidos em caráter temporário (ACTs), eliminando o direito ao  FGTS e da multa rescisória dos professores contratados em regime temporário. E na sua “semana de prefeito” o maior feito foi sancionar a medida que eliminou os direitos dos professores.

Confunde-se quem acredita que o maior problema do trio é misturar política e religião, não é. O problema está no tipo de sociedade que sonham, o cristianismo que professam e para que projeto político trabalham.

Quando li pela primeira vez a frase do vereador que se diz defensor do cristianismo, lembrei do discurso do pastor Batista, pacifista e militante dos direitos civis Martin Luther King.

O famoso discurso eu tenho um sonho, diz: “Eu digo a você hoje, meus amigos, que embora nós enfrentemos as dificuldades de hoje e amanhã… Eu ainda tenho um sonho… Eu tenho um sonho que um dia esta nação se levantará e viverá o verdadeiro significado de sua crença – nós celebraremos estas verdades e elas serão claras para todos, que os homens são criados iguais… Nós nunca estaremos satisfeitos enquanto o Negro for vítima dos horrores indizíveis da brutalidade policial…. Não, não, nós não estamos satisfeitos e nós não estaremos satisfeitos até que a justiça e a retidão rolem abaixo como águas de uma poderosa correnteza… Mas não vamos satisfazer nossa sede de liberdade bebendo da xícara da amargura e do ódio.”

Houve também um outro discurso. O chamado de sermão das montanhas. Na Bíblia Sagrada ocupa três capítulos do livro de Matheus, começa no quinto e vai até o sétimo. Alguns dizem que este é o discurso central do cristianismo. Nele, o Cristo de Nazaré aponta as principais conduta de comportamento moral e ético de um cristão. As bem aventuranças seriam o caminho para uma vida feliz. “Bem-aventurados são os pacificadores, porque eles serão chamados filhos de Deus”

Chama a atenção para o cuidado que necessário com os falsos profetas e que estes enganariam multidões. “Guardai-vos dos falsos profetas. Eles vêm a vós disfarçados de ovelhas, mas por dentro são lobos arrebatadores” A trinca de vereadores  da câmara de Blumenau não defendem o cristianismo, defendem apenas seu projeto de poder e para isso utilizam boa-fé das pessoas. 

4 Comentário

  1. Parabéns ao colunista pela análise didática e também profunda sobre o episódio. Como professores precisamos educar para a solidariedade que traz a paz. Não precisamos de armas para educar. Vergonhosa a atuação do nosso legislativo municipal. Despreparo e oportunismo. Acho que Blumenau merece mais.

  2. Fica evidente o espelho dos casos profetas a politicos que se dizem cristãos. Deveria haver um tratado ecumênico que banisse os lobos que usam o nome de Cristo para contrariar os mandamentos sagrados.

  3. O articulista é um legítimo representante da chamada teologia liberal, aquela que busca adequar a bíblia ao seu estilo de vida, e não o contrário.

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