Opinião | Reflexões filosóficas gregas – Parte IV – Leito de Procusto

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Os povos que compunham a cultura Grécia Antiga, são considerados relevantes para a compreensão do mundo, por conta de suas reflexões. Muitas destas reflexões foram realizadas através de alegorias (e talvez por isso sejam sempre atuais), onde uma estória, busca transmitir uma mensagem, que é alcançada através de uma reflexão racional.

Como já abordado em outras reflexões filosóficas gregas, o mundo conceitual grego, novamente aqui, será fornecedor de uma interpretação, para uma reflexão contemporânea. Desta vez, se caminhará na floresta, correndo risco de ser capturado. O risco está no fato de, ao ser capturado, o refém saber que, fatalmente, terá de se adequar a padrões estabelecidos.

Esta alegoria, versa sobre um indivíduo que, de forma muito acolhedora, recebia viajantes em sua casa. Ao receber os convidados, ele os convertia de hospedes em vítimas. Em sua prática cruel, este a princípio gentil anfitrião dos viajantes da floresta, prendia seus cativos em uma cama. Esta cama, tinha um tamanho específico, que nunca era das dimensões de seu usuário.

Eis que este cruel anfitrião de nome Procusto, tinha uma artimanha. Na verdade, ele tinha dois leitos de tamanhos diferentes, podendo fazer uso de um ou de outro conforme a situação, tendo como intuito único, fazer com que o usuário não coubesse nas dimensões da cama. Desta maneira, ao contrário do usual, Procusto, ajustava o tamanho do usuário, ao tamanho de seu leito.

O sentido proposto desta alegoria, pode ser observado em diversos sentidos, um deles, no contexto educacional, será objeto desta crônica. Se realizada a devida observação, é exatamente a forma que Procusto ajusta seu leito, o modo como os estudantes (e muitas vezes, por extensão, seus familiares) encaram o desafio do conhecimento.

A expressão leito, tem um sentido metafórico para as conveniências e opiniões pessoais, bem como os preconceitos mais íntimos que os indivíduos tem, ou constroem. Tendo construído esta sua estrutura de conveniência, passam a encarar todo o universo ao seu redor, exigindo que toda a imensidão de visões existentes no mundo, se adeque aos seus anseios, ignorando a evidente lógica da realidade.

Sim, neste momento se descortina um dos mais importantes elementos encontrados na reflexão desta alegoria. Que demonstra o brilhantismo do pensamento grego antigo, que já há mais de dois mil anos antes da atual pós-modernidade, reflete sobre as discordâncias de opiniões. A arrogância de considerar que o seu ponto de vista, irredutivelmente, está correto, por mais que existam diversas comprovações do contrário.

Procusto apresenta características que são fortemente encontradas nos modos de agir e se relacionar com as pessoas na sociedade contemporânea do século XXI. Num momento em que a sociedade brasileira apresenta cada vez mais, traços ansiedade e agressividade, Procusto parece ser a representação perfeita do comportamento geral da população, que busca, não refletir sobre a realidade, mas argumentos, para defenderem sua versão do leito de Procusto.

No ambiente escolar, este modo procustiano de agir é fortemente influenciado pelas redes sociais. A instituição escolar, passa a carregar o pesado fardo de ter de buscar promover uma sociabilidade humana, pensando na preparação do indivíduo para o exercício da cidadania. Exercício este, que busca fazer com que as pessoas exercitem o respeito e a empatia, como sempre se idealizou as concepções de ensino.

O que tem mudado no universo educacional pós-moderno é o fato de que os alunos vão à escola, com uma mentalidade pré-formatada, não disposto a conhecer mais sobre o mundo que os cerca. Neste contexto o professor, não e conhecido como um profissional, detentor de um conhecimento formal, habilitado e sim, como alguém que, deve “convencer” o aluno do conhecimento formal que professa.

A relação estabelecida no curso de apenas alguns anos, de algumas poucas décadas, descortinou diversos elemento, da ethos (conjunto de hábitos e característica de determinado grupo) do brasileiro. Este padrão comportamental, não busca conhecer, aprender, expandir seus horizontes de conhecimento, mas sim, a conveniente manutenção de seus posicionamentos. Assim, da mesma forma que Procusto, usando as dimensões de seu leito como paradigma social.

Quando se busca gerar um progresso de uma população, de uma comunidade, é necessário a busca pelo conhecimento, não a manutenção confortável de opiniões individuais. O processo de amadurecimento, de promoção do progresso, seja de um indivíduo, ou de um grupo social, é construído através do desenvolvimento da convivência, do exercício da prática da empatia e da tolerância.

Partindo da alegoria de Procusto, se pode promover a conclusão, não somente sobre o quão é atual, a interpretação desta alegoria da cultura grega. Nesta direção, se percebe que, há um longo caminho a ser percorrido, rumo a um desenvolvimento social consistente, atingindo o objetivo desejado por todos. Assim, se deve compreender, que, diferentemente do leito de Procusto, a realidade não é estática, passa por muitas mudanças, e estas, não é vinculada a defesa de meras opiniões pessoais.

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