Opinião: (ir) responsabilidade ambiental

Foto: reprodução

Na próxima semana, nos dias 22 e 23 de abril acontece a Cúpula de Líderes sobre o Clima. Convidados pelo presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, os presidentes de outros 39 países como a China, a Rússia e o Brasil estarão reunidos com Biden por meio de uma conferência virtual. Segundo nota da Casa Branca, o presidente americano solicitou que os líderes convidados usem a oportunidade do encontro para apresentarem o modo como os seus respectivos países podem contribuir de um modo mais intenso para com as possíveis soluções aos problemas climáticos. Esse encontro virtual visa ainda se projetar como uma preparação para a Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (COP26), a ser realizada em novembro.

Chamo especial atenção não somente para o Brasil como nos parece, e sim para o Brasil como quer parecer nessas relações internacionais sobre o meio ambiente: como um cão diante de uma máquina de assar frango. Apesar de esse espaço “O Brasil como nos Parece” dentro do jornal ser reservado à opinião dos autores dos artigos, essa imagem do Brasil aos EUA não é uma opinião, não é uma figura de linguagem. Essa é a imagem, é a ilustração que, segundo a Folha de São Paulo, o nosso Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles inseriu em um slide e apresentou à equipe que o presidente dos EUA enviou ao Brasil para reuniões em preparação para a Cúpula de Líderes sobre o Clima.

Em pensar que nessa imagem o Brasil é o cão, um cão em frente a máquina de assar frango, babando, mendigando na esperança de cair uma migalha daquela máquina. Outros levarão os frangos, que é o objeto de desejo do cão em tal situação. O cão não tem condições de conquistar com o seu mérito aquele frango. Depende inteiramente da boa vontade de quem tem mérito. Para ele restará apenas ossos ou migalhas, rejeitos, se conseguir convencer alguém. Essa é a imagem que o Brasil quer passar. Ou, ao menos, que o nosso ministro passou, associando os frangos à expectativas de pagamentos de governos estrangeiros para que só assim o governo se comprometa a preservar o meio ambiente, sendo que a própria Constituição Federal de 88 impõe esse compromisso de preservação ao governo, independente de pagamento de quem quer que seja.

Visando o compromisso à preservação, essa semana mesmo foi protocolada por alguns jovens uma Ação Popular na justiça de São Paulo, com o apoio de sete ex-ministros do Meio Ambiente, contra o atual Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles e também contra Ernesto Araújo em decorrência da alteração das metas que o Brasil havia assumido no Acordo de Paris, diminuindo consideravelmente o compromisso com a preservação.

Argumentos éticos, estéticos e outros poderiam ser invocados por uma chamada de atenção para a preservação do meio ambiente, mas não é a isso que recorro aqui. É importante ter presente que a existência do planeta não precisa ser “salva”, o planeta continuará a existir para além dos seres humanos. O planeta é maior que a economia, é maior e mais antigo que a vida humana e continuará a sua história independente de nós. A existência que precisa ser “salva” é a do ser humano, que não sobrevive sem condições mínimas de natureza. Tendo em vista o interesse em sobrevivermos é que sugiro uma chamada de atenção para com os limites da natureza para o desenvolvimento econômico, como um meio para a nossa própria sobrevivência.

Não há mais espaço para um debate ingênuo em torno do progresso e do desenvolvimento como se caminhássemos sempre para o melhor dos mundos possíveis. O debate em torno do desenvolvimento nos dias atuais deve levar em consideração os riscos inclusive da confiança inquestionável na técnica e na tecnologia. Agora, como questão de sobrevivência, é salutar questionarmos pelos riscos da economia tradicional que tem nos oferecido episódios como os desastres de Mariana e de Brumadinho, e, com isso em mente pensarmos em condições de possibilidades de desenvolvimento.

Não busco defender nesse rápido artigo a ideia de um decrescimento ou de estabilizar o crescimento como uma noção a ser valorizada. A minha abordagem reconhece, no entanto, que estamos em um planeta limitado e que o produto final do crescimento econômico é a produção de lixo (que é deixado no mesmo planeta no qual estamos a viver). Quando dizemos em jogar o lixo fora, não existe o “fora”. Ainda é o mesmo planeta. Além, é claro, nunca é demais lembrar do esgotamento de recursos desse mesmo planeta, recursos esses que não raro não se renovam. Isso implica dizer que há um limite que o planeta não consegue ultrapassar para manter a vida humana em suas iniciativas pela busca pelo crescimento econômico e do desenvolvimento ilimitado. Nesse sentido, talvez não só pelo planeta, talvez não só pelo meio ambiente, mas para mantermos a vida humana há a necessidade de se discutir os limites empíricos das teorias de desenvolvimento.

Enfim, há muitos desafios e preconceitos nesse tipo de debate em torno do meio ambiente a serem superados. Com alguma frequência estamos a acompanhar cotidianamente esforços em torno da sustentabilidade, esforços esses como o Acordo de Paris, a Cúpula de Líderes sobre o Clima, a Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas ou, ainda, de modo mais pontual a criação da primeira usina de geração de energia por meio de esgoto e lixo orgânico instalada no Paraná. Além, é claro, dos debates em torno da dieta perfeita para salvar não só o meio ambiente, mas, também, a saúde dos seres humanos. Contudo, talvez esse seja um debate que em geral está restrito a uma elite, com discussões que talvez não estejam acessíveis de modo qualificado ao grande público. Para além disso, se apresenta em certa medida também impraticável pela grande maioria da população, que, por exemplo, não teria acesso aos alimentos “ideais” para salvar o meio ambiente e a sua própria saúde, mesmo que soubesse quais são. Ainda há muito a ser feito!

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