Opinião | Recompensa ou punição?

Foto: Eduardo Valente/Secom/Divulgação

O assassinato de quatro crianças numa creche em Blumenau, dia 05 de abril, por um verme social, expõe nosso fracasso civilizatório e o que nossa sociedade produziu de pior nas últimas décadas: uma escória de criminosos com direitos e a pusilanimidade política que decretará o fim do Ocidente, se assim continuarmos.

Não é bom ficar calado. Mas de pouco valem as expressões de solidariedade, tão francas quanto vazias, porque tudo se entrega nas mãos de Deus ou da justiça formal e distante, incapaz da mesma empatia que falta ao criminoso. Tudo é frio e burocrático na sociedade dos indivíduos de direitos, onde o senso de comunidade desaparece e só resta a relação isolada do indivíduo com o Estado.

Há pouco tempo atrás, toda essa criminalidade era impensável num estado como Santa Catarina, que sempre teve alto senso de comunidade. E quando esse senso desaparece, coisas horríveis acontecem e o que sobra são as roupas no varal que nunca mais vestirão aqueles corpos. Precisamos falar abertamente sobre esse problema e nos perguntarmos por que isso era impensável até ontem e agora se tornou previsível.

Meu sentimento, pra além do indizível e de solidariedade igualmente vazia com os familiares, é de derrota civilizatória. E a sociedade, nosso meio de vida e nosso tema de análise, parece incapaz e tratada como tal pelos três poderes da república. Somos tratados como imbecis, incapazes de julgar e punir, submetidos ao julgo e decisão de especialistas, suas presunções e ilusões.

Pra que tanto conhecimento, tanta especialização, tanta ética, se não conseguimos proteger as crianças de uma deformidade humana como essa, cheia de direitos e cuidados especiais? Segundo o site Banda B, do Paraná, esse criminoso, forasteiro como a totalidade dos bandidos, havia tido 4 passagens pela polícia. Aposto que, ao registrar o primeiro boletim de ocorrências, o delegado deve ter avisado: isso ai não tem cura, ainda fará muito mal à sociedade.

Mas, aí vem os especialistas e retiram da Polícia e da Sociedade qualquer competência de analisar, opinar, sugerir e punir. Não! Quem entende dessas coisas são os profissionais qualificados que, com todo o conhecimento e corporativismo acima da vontade geral, desenham a situação; dão diagnóstico e prognóstico, apontam a causa geral e decidem o que é melhor pra sociedade.

É assim:

– às vítimas, nossos mais profundos sentimentos e vida que segue;

– a sociedade: impotente e retirada de processo decisório, por incapacidade oriunda de preceitos morais e preconceitos que não passam pelo filtro dos especialistas;

– a sociedade política: falida, porque seus constituintes já venderam a alma materna, nada restando que não tenha sido negociado a preço de privilégios; as leis servem aos advogados, primeiro, depois aos indivíduos de direitos; só depois ao interesse republicano.

– o assassino: uma velha vítima da sociedade, partindo de uma concepção tão arcaica e romântica quanto cínica e pusilânime, segundo a qual o homem é bom, mas a sociedade o corrompe, todo pedagogo o sabe, concordando ou não.

Furtou, roubou, matou, estuprou? Foram as condições de vida e, então, desumaniza-se o autor, retirando-lhe o que tem de mais humano: a capacidade de decidir e assumir responsabilidade pelos seus atos.

Como é vítima, o assassino será tratado primeiramente como paciente, depois hóspede e, depois, novamente como paciente e hóspede, tudo pago pela sociedade que o maltratou e fez dele um covarde egoísta e infanticida. Pronto: é o auge do processo evolutivo ocidental, a justiça está reparada e o sentimento de culpa diminuído, resolvido. Já podemos seguir em frente.

Há uma concepção antropológica totalmente oposta a essa, segundo a qual o homem é o lobo do homem e tudo precisa ser feito para evitar que o pior aconteça. Lei e educação severas. Então, ele já não será a vítima desumanizada pela sociedade. Ele é alguém que pensa, decide e precisa assumir o que faz, sabendo das consequências.

Essa concepção gera um raciocínio e uma operação totalmente distinta e mais eficaz do que a gerada pela torta democracia liberal que construímos: é aquela que diz que o ato criminoso é correspondente ao cálculo da punição x recompensa.

Se o criminoso souber que será esquartejado em praça pública por ter assassinado crianças, no mínimo ele não se entrega vaidosamente à Polícia; hesita, graças a Deus, graças à lei e à educação severas. Ou então se mata antes e livra a sociedade de parte da gentalha miserável que ele representou.

E, então, ele não fará parte da escória de direitos de uma sociedade vencida pela pusilanimidade. No seu lugar, revigoram-se os direitos republicanos, que é o que devemos começar a ensinar nas escolas e universidades, a começar pelos cursos de direito e das ciências humanas, reestabelecendo a noção reta de justiça.

O que o assassino obteve foi a recompensa de ter imagem e nome disseminados nas redes sociais, sob o aplauso da comunidade de miseráveis morais que estão por trás dele. Todos precisamos saber, a começar pela justiça tardia, que a internet obscura, seja lá o nome que se dê, está repleta dessa sub-raça, uma escória com direitos individuais. A sociedade não é culpada por gera-los, tire-se isso da cabeça. Somos responsáveis, sim, por suportá-los.

Se, diante de uma tragédia como a de 05 de abril não nos dispusermos a discutir isso e prioritariamente isso, nossos títulos de mestres e doutores não valerão mais nada. A autocrítica ainda é o que resta de esperança ao Ocidente. É sua melhor herança civilizatória, ante o que produzimos de pior: anomalias humanas portadoras de direitos.

Na ausência de leis severas, incluindo o limite de direitos, vale o cálculo do assassino e do estuprador, presumindo, com razão: baixa punição e recompensa. Assim, permitimos que um verme humano seja capaz de se envaidecer, sentindo-se vencedor de um jogo, um jogo em que o vencedor mata crianças de verdade e ganha uma medalha.

E, com todos os sinais, todas as evidências, nossa sofisticada inteligência científica e ética, em nome da liberdade individual, não consegue proteger crianças numa escola. Mas é capaz de garantir a vida de um miserável assassino de crianças e os direitos autorais de seus jogos assassinos.

Um extraterrestre, descendo à Terra, jamais nos entenderia. Mas, nem tampouco todos os profissionais especialistas em problemas sociais e nos direitos individuais, consegue, nem de longe, compreender a indignação conservadora da sociedade humilhada. Nem eu compreendo, apesar da indignação, tanta passividade. Parecemos não aprender, com a história, que é nesses momentos que surgem, inclusive os demagogos, que nos prometem o céu e nos levam ao pior dos infernos.

Não tenho a presunção da verdade, mas o asco que sinto exige de mim esse desabafo e a provocação ao debate. E meu ponto de partida é que a sociedade não pode mais ser humilhada, tampouco a moral que nos trouxe aqui ignorada. Chega dessa humilhação. Quero minha cidade de volta e pena de morte a quem a ofende assassinando nossas crianças.

E que assim seja, antes que o criminoso saia da cadeia por bom comportamento e volte a matar inocentes, rindo de nós novamente. Chega de homens e mulheres honestos serem culpabilizados pela desigualdade social que não criaram e que serve de explicação para o crime. Basta de perdão e recompensa. Precisamos de vingança e punição.

Walter Marcos Knaesel Birkner, sociólogo.

1 Comentário

  1. Somente verdades e representa o sentimento de muitos. E digo mais enquanto continuamos deixando Deus fora das nossas creches e escolas, já que as bíblias por exemplo foram retiradas, deixa-se o caminho aberto para a maldade humana entrar.

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