Opinião | O Pagador de Promessas

Foto: Josué de Souza

Na última sexta feira que antecede o domingo do advento, protegido por um banner, como quem buscava privacidade, um homem fazia uma oração ao seu deus. Ao seu lado, um pilha de panos de pratos que seriam oferecidos aos motoristas dos automóveis que passavam pelo portal do parque da Vila Germânica, principal atrativo turístico da Alemanha sem passaporte. Como na obra O Pagador de Promessas, de Dias Gomes (1962), o ambulante parecia não se importar com o calor do sol do meio dia ou com o infernal barulho do trânsito.

O banner em que se abrigava faz propaganda do Natal de sonhos e magias, porém a cena registrada em Blumenau, infelizmente, é corriqueira e representativa da realidade em que transformou-se as terras de Santa Cruz. Segundo o IBGE, no 3º trimestre de 2021, a taxa de desocupação foi de 12,6%, enquanto que a taxa subutilização da força de trabalho atingiu 26,5%. Em Blumenau, segundo estimativas do SIGAD/FURB – estimativa porque com a ausência do CENSO, vivemos um apagão de dados -, apontam que entre 50 e 55 mil pessoas vivem na informalidade.

O personagem da obra de Dias Gomes realizava suas rezas sincréticas em terreiro de candomblé, direcionado para Santa Bárbara, uma santa católica. No Brasil contemporâneo, as súplicas são para o deus neopentecostal, católico ou evangélico. Sincrético como antes, espalhados pelas cidades e periferias. Legitima a desigualdade, individualiza a pobreza e interpreta o sofrimento como fruto de maldição ou de falta de fé.

Em meio a essa massa de informais e sem empregos, os que erguem as mãos aos céus não fazem isso por falta de escolaridade ou por serem vítimas de ludibriamento de algum líder religioso inescrupuloso. Sua fé é um mecanismo de resistência e fuga da aridez cotidiana. A fé é a única esperança de uma classe social que a cada dia enfrenta o risco de ser jogada para o fundo do poço social. Uma roleta russa econômica em um faroeste neopentecostal. Erguem as mãos em busca de uma forma mágica que os liberte da fome, da rua e do desemprego.

Enquanto isso, líderes religiosos confabulam politicamente. Agora, celebram a filiação do presidente em seu novo partido político, no dia dos evangélicos. Como diria Zé: “Colocaram o céu no lugar do inferno e o demônio no lugar dos santos”

2 Comentário

  1. Ótimo texto!!

    Por essas e outras é que afirmo: a estarem no céu malafaias, edires macedo, waldemares santiago, rr soares e outros (acompanhados do “verme” e sua adorável esposa micheque) estarei muito feliz no inferno!

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