Opinião: módulo de sobrevivência

Foto: reprodução/Marcos Corrêa/PR

O garrote no qual o Governo Bolsonaro foi submetido está apertando muito. Afinal, por um lado, fecha-se o cerco legal (rachadinha, gabinete do ódio, Queiroz, etc.); por outro, cresce a pressão política (pedidos de impeachment, manifestações, etc.). Neste sentido, a ação de procuradores e juízes se junta a mobilização política nas ruas reduzindo muito o perímetro de manobra institucional e político do Bolsonarismo. Assim, ao mesmo tempo que a imagem do presidente se deteriora, seu governo vai perdendo os meios políticos de reabilitação institucional. Portanto, o garrote do Governo Bolsonaro acionou o Módulo de Sobrevivência do Bolsonarismo.

O Módulo de Sobrevivência diz respeito a perda da capacidade de operação política do Bolsonarismo. Foi acionado para enfrentar a convergência de dois conjuntos de forças. Por um lado, o crescimento da avaliação negativa do Governo Bolsonaro desencadeada pelo encontro da Curva do Contágio com a Curva de Desemprego; por outro, a fragmentação do bloco bolsonarista devido às sucessivas derrotas no confronto com o Legislativo e o Judiciário. A perda de apoio político e o enfraquecimento institucional tornam o Governo Bolsonaro cada vez mais dependente da tutela da militarização governamental e da compra de proteção política do Centrão.

Portanto, a questão de fundo aberta pelo acionamento do Módulo de Sobrevivência é saber quanto o Bolsonarismo consegue resistir ao garrote dos freios e contrapesos democráticos. Afinal, o Bolsonarismo constitui uma estratégia de verticalização do poder. Mais precisamente, utilizar o primeiro mandato para enfraquecer internamente as instituições e um eventual segundo mandato para implantação de um programa autoritário. É por isto que, por um lado, as ações de seu governo (Guedes, Araújo, Sales, Weintraub, etc.) se dedicam ao desmonte das estruturas existentes; e, por outro, o processo de radicalização política por meio da polarização

Assim, embora o Bolsonarismo ainda detenha importantes instrumentos de poder eles não podem ser utilizados porque o Presidente Jair Bolsonaro se nega a governar. Afinal, ignora as prerrogativas administrativas pois não acredita que os problemas sociais possam ser resolvidos no marco institucional fixado pela Constituição de 1988. E de crise em crise o Governo Bolsonaro vai perdendo as condições de governabilidade. Por isto, com a Neutralização da Máquina de Fake News e a Desarticulação da Capacidade de Mobilização restam apenas três movimentos: a) a narrativa de vitimização; b) a intimidação militar; c) ameaçar as instituições.

  • Discurso da Perseguição: inflamar a narrativa da perseguição política e institucional do Governo Bolsonaro. Trata-se, assim, de convencer seus apoiadores que o Governo Bolsonaro é vítima de uma conspiração. Por isto, o Governo Bolsonaro propaga a ideia que as ações contra o Congresso e o controle das instituições é uma forma de conter as injustiças. Este processo, evidentemente, não envolve mais atrair novos apoiadores, mas apenas evitar a perda dos existentes. Portanto, o Bolsonarismo tem a percepção de que o Judiciário e o Legislativo cerceiam deliberadamente o Executivo.

  • Tutela Militar: aceleração do processo de militarização do governo. Além disso, o Presidente Bolsonaro se apresenta como um presidente militar. Por isto, se sucedem notas de intimidação assinadas por militares; e, até mesmo, marchas contra a democracia feitas pelo presidente eleito democraticamente; estimular a rebeldia das polícias. Isto mostra que o funcionamento das instituições de freios e contrapesos se transforma numa ameaça e se converte em pretexto para radicalização do Bolsonarismo. O efeito combinado deste processo constitui à repolitização das forças militares.

  • Ruptura Institucional: o Bolsonarismo considera o governo por vias democráticas é impraticável. Por isto, vislumbra a possibilidade de uma solução de força. Este processo envolve o alinhamento, ao mesmo tempo, das polícias militares e da capacidade de transformar o Exército em instrumento político. Para isto, o Bolsonarismo precisa neutralizar tanto os canais de comunicação entre o Judiciário, o Legislativo e as Forças Armadas; quanto contar com a degradação das condições institucionais. Portanto, trata-se de manter dividido o Exército e contar com o aumento da instabilidade.  

Estes três movimentos não são operacionalmente excludentes. Ao contrário, a Narrativa da Perseguição justificaria a Tutela Militar que leva à Ruptura Institucional.  Afinal, como o Presidente Bolsonaro não conseguiria governar pelo cerco do STF e o bloqueio do Congresso, a única alternativa seria romper as regras do jogo. Para o Bolsonarismo, somente com um governo forte seria possível controlar a anormalidade criada pela redemocratização. Tratam-se, assim, de três movimentos complementares que podem ser politicamente articulados. O efeito combinado deste processo pode induzir um levante militar. Consequentemente, a articulação destes três movimentos intensifica o processo de desmonte da ordem democrática instituída a partir de 1988.

Para desativar do Módulo de Sobrevivência o Bolsonarismo precisa expandir o poder governamental do Presidente Bolsonaro. Os rastros jurídicos e políticos deixados pelo padrão de atuação do Bolsonarismo limitaram a capacidade de mobilização do presidente. Afinal, dor um lado, existe a ameaça de deposição por impeachment (Congresso), enquanto de outro, a impugnação da chapa (TSE). Neste sentido, indica que a disputa política se torna ainda mais brutal na medida que implica a neutralização dos demais poderes. Porém, extinção dos meios de reprodução política tornam o Bolsonarismo ainda mais perigoso. Afinal, se reduz aos grupos mais extremistas.  

Com o Módulo de Sobrevivência do Bolsonarismo acionado, portanto, o país se tornou refém da Crise Tríplice (sanitária, econômica e política). Porém, paradoxalmente, ao mesmo tempo que a Crise Tríplice inviabiliza o Governo Bolsonaro, ela também impede sua resolução na medida em que esvazia a ruas e dificulta as articulações políticas. Afinal, se a Crise Tríplice compromete a reprodução do Bolsonarismo no longo prazo ela também garante a sua sobrevivência no curto prazo. Neste sentido, a situação brasileira vai se tornando cada vez mais dramática pois verifica-se a diminuição da segurança, do crescimento e da previsibilidade.

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