Opinião | Cogito ergo timeo II – Sobre a importância do Estudo da História – Idade Média

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Como já mencionado na crônica Cogito ergo timeo, este título, tem por ensejo, fazer alusão ao cogitar, ao modo de interpretação do filósofo francês, Renè Descartes (1596-1650). Mas, no presente texto, se irá lançar o olhar, para uma visão racional, sobre a historiografia, o conhecimento do curso de transformação humano e social, que trouxe a espécie humana até onde está (com um olhar especial sobre o período medieval).

Muitas vezes, os estudantes podem indagar, “Nossa, Idade Média. Isso faz muito tempo, já se vão séculos que isso aconteceu. Então, para que irei necessitar disso?”. Há o questionamento sobre, como um período tão “distante”, afeta a vida das pessoas, de que modo, ainda se pode encontrar reverberando, os sons deste momento histórico na vida das pessoas. Afinal de contas, depois do medievo, já houveram outros períodos, como o iluminismo.

Pois bem, como já mencionado em outro momento, quando a resenha se dedicou a refletir sobre Agostinho de Hipona, muitas das questões que sustentam hoje a crença cristã, foram construídos pelos pensadores deste período. Questões como, a perfeição de Deus e a possível contradição com o Livre Arbítrio, foram questões brilhantemente solucionadas por este pensador. Mas há, também, elementos negativos neste período, afinal de contas, foi batizado na historiografia popular, como Idade das Trevas.

E é exatamente neste ponto, na acepção do termo Trevas, que esta crônica busca promover uma breve reflexão contemporânea. O período em questão, ficou marcado por diversas faces de fanatismo e descredito do conhecimento real sobre o mundo. A negação de elementos que haviam sido provados, durante os momentos anteriores da história humana, e que passaram a ser considerados como algo negativo, maculado, que neste momento, foi chamado de bruxaria.

O conhecimento científico formal, passou a ser exercitado apenas dentro de lugares específicos, os mosteiros que, posteriormente, vão gerar uma noção de cátedra (observa-se a relação com a palavra catedral), como conhecimento formal. Estas cátedras, fazendo referência as mais antigas universidades existentes, que em grande parte, terão relação com monarquias cristãs, e representações muçulmanas (que neste período, eram a vanguarda da ciência).

Se sabe, através do estudo da historiografia que, neste momento da humanidade, este conhecimento era desenvolvido nestes celeiros do saber, enquanto a maior parte da população, era condenada ao desconhecimento. As crendices se esparralhavam através das bocas das pessoas, propagando uma grande quantidade de elementos que, posteriormente, fundamentam muitas das ações e práticas do cristianismo.

Neste contexto histórico, a presença do sacerdote, tinha uma importância fundamental. Este, percorria grandes distâncias, para amparar emocionalmente suas comunidades (esta expressão, posteriormente, inspira a palavra comunismo). A presença do sacerdote, em muitas localidades representava um grande evento, a ponto da visita do sacerdote, a sua presença, ser considerada uma graça.

A possibilidade de estar próximo do sacerdote, receber uma benção, beijar-lhe a mão, na crença popular, representava um sinal de boa sorte. De proximidade com o divino (é deste contexto de veneração, que surge muito do que se conhece na contemporaneidade, de veneração à um ídolo, como um cantor, ator, etc.). É de se compreender que, nestas condições, uma pessoa, considerada tão elevada, evidentemente, tinha em suas palavras um tom de poder, superior a muitas autoridades locais, pois representava o sagrado, o divino.

Este aspecto de autoridade, parece que, durante o século XXI, passou por uma ressignificação. Esta nova postura de relação com o sagrado, passou a tomar durante a pós-modernidade, uma nova condição que remete ao medievo. A palavra do sacerdote, que não fazendo uso apenas do púlpito, mas agora também das redes sociais, passa a exercer uma grande influência na vida de sua comunidade, possibilitando, mui por certo, um amparo mais próximo.

Ser detentor desta proximidade, associado à uma fala de autoridade, faz com que este indivíduo, exerça um grande poder sob sua comunidade. Este poder, foi fundamental, em situações como a pandemia de Covid 19. O meio mais próximo de contato com a comunidade, eram as redes sociais, que exerceram a função de consolo emocional para as pessoas que padeciam emocionalmente ante o desconhecido desta nova enfermidade.

Mas infelizmente, da mesma forma que um tratamento pode ser benéfico ao espírito humano, se bem administrado, pode produzir um efeito devastador, se empregado de maneira adequada. Esta representação, infelizmente pode ser observada pelos diversos relatos de abusos, que para a tristeza de todos, insistem e aparecer nos noticiários. Há sempre pessoas com más intensões prontas à se favorecerem do coração humano.

A palavra Religião, deriva do termo latino religare, ou seja, voltar a ligar, ligar novamente. Desta maneira, a Religião, tem a intenção de religar o fiel, com a força divina. No cristianismo, a ideia de comuna, ou comunidade, busca promover esta reconexão com o divino através da convivência com o semelhante, frequentemente, nomeado de irmão. Desta forma, o sacerdote, tem a obrigação de promover uma união harmoniosa de sua comunidade, permitindo que esta convivência, os aproxime da graça divina.

É exatamente por conta da ciência desta noção que, muitos sacerdotes se aproveitam de sua condição de representante, para agirem de modo totalmente avesso ao que é determinado pelo cristianismo. Isso se observa quando, um sacerdote faz uso do seu poder de fala, para promover divulgações de ideias que não estão relacionadas com o elemento religioso, manchando o solo do templo que representam com falas mundanas.

É evidente que, em uma pregação o sacerdote, fale sobre o contexto social e político se sua comunidade, afinal de contas, a vida da comunidade, também é permeada por questões políticas. Mas há um momento em que, famílias se separam por conta de retóricas lançadas pelo sacerdote, que deveria pregar a paz e o amor (premissas cristãs), e fazem exatamente o contrário, utilizando os textos, tidos como mais sagrados, da Bíblia, para representar suas concepções pessoais.

Se pode perceber que esta forma de lidar com a realidade, presente na fala de alguns sacerdotes (que para o bem dos fiéis, nem de longe representam a maioria), é um forte traço daquilo que foi determinante para que o Período Medieval viesse a ser chamado de Idade das Trevas. Este termo, neste contexto, é muito adequado, afinal de contas, quando algumas pessoas, se valem da crença de muitas, para seus interesses e para a crueldade, realmente se percebe um contexto de trevas.

Desta forma se pode aqui concluir que, apesar de se passado séculos entre o momento histórico que ficou conhecido como medievo e a contemporaneidade do século XXI, há uma série de elementos que ainda se percebe presentes. Esta crônica, não tem por ensejo, criticar o sacerdócio, que em muitos momentos, acaba sendo para muitas pessoas, o único bálsamo possível diante das duras condições de compreensão e lida com a realidade.

Mas tem como afã, contextualizar a pergunta que aparece no segundo parágrafo desta crônica, sobre o motivo para se estudar História, o desenvolvimento humano, que está registrado (parece salutar ressaltar este aspecto), que produz o indivíduo contemporâneo. Demonstrando através desta relação, o quanto o ser humano, contemporâneo, orgulhoso de seu wifi, bluetooth, dentre outras parafernálias tecnológicas, tem em comum, com os indivíduos que acreditavam em bruxas, duendes, terra plana, etc.

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