Opinião: a poesia do futuro

Imagem: Cildo Meirelles, Zero Real. Divulgação Web.

“Foi então que surgiu o Máximo Divisor Comum. Frequentador de círculos concêntricos, viciosos. Ofereceu-lhe uma grandeza absoluta e reduziu-a a um denominador comum. E tudo que era espúrio passou a ser moralidade, como, aliás, em qualquer sociedade”. O recorte de Millôr Fernandes ilustra em poesia uma pequena parte das verdades que os números revelam. Se as palavras iludem e distorcem a realidade por romantizar as avaliações apaixonadas, a matemática não mente. Fria e concisa, se a verdade não está no resultado, claro e evidente a dois palmos das fuças do indivíduo, algo de errado existe: nossas convicções ou a conta. Talvez os dois!

Desde o início dos tempos, o humano busca, por meio das mais diversas técnicas, antecipar o que está logo ali, na próxima curva da vida. Prever o clima para agricultura, os céus para os apaixonados, o nível de cheia dos rios, os passos de um inimigo em um campo de batalha… enfim, sobram modelos, nestes anos de existência, que de alguma maneira esperam adiantar as dores. É o desejo que o tempo seja o suficiente e capaz de permitir o surgimento da solução dos problemas antes que eles ocorram de fato. Nem sempre funcionam. Nem sempre compreendemos. Muitas vezes aceitamos bobagens.

Já está posto: o Brasil crescerá cerca de 4% em 2021. É muito? É pouco? Não importa tanto assim! A estatística econômica deste ano é comparada com o que passou. A base de 2020 foi muito, mais muito baixa. E se for olhar para os países mais ricos do mundo (China e Estados Unidos) fica mais evidente que formamos uma nação atrasada, lenta com passos de caranguejo. Os mesmos dados que balizam o sobe e desce do PIB também apontam para uma dificuldade gigantesca ali, no futuro do país. Voar além, ou igual, ao ano favorável matematicamente é um desafio para lógica da estatística. É acreditar que o país fará o que nunca fez: milagre!

O mesmo engano que os números causam ao olhar despreocupado para os dados de crescimento deste ano, também serve para a inflação. O 2020 foi, por conta de diversos motivos, um período que registrou forte paralização em toda cadeia de suplementos, serviços. Nossa sorte deu um respiro para subida de preços. Não retiro a culpa do Governo Bolsonaro de, em dois anos, desorganizar mais a economia que a gestão Collor ou qualquer outro da história moderna do país. Mas, também é verdade que a hiperinflação (40% no IGP-M) renasce reforçada por uma base muito ruim de comparação.

Os números não mentem. Nossa interpretação que é falha. Você não é um idiota. Respire mais e faça as contas, compare com dados reais. Estimule os neurônios para criar seu próprio parâmetro de proteção contra a ignorância. Na próxima vez que alguém dizer que este ou aquele lugar, por exemplo, reuniu X pessoas em prol disto ou daquilo olhe para o lado e busque uma ancora para o dado recebido: quantidade de habitantes, veículos,palitinhos no seu bolso… tanto faz! Se fazer sentido para você guarde. Faça a ciência acontecer. Pratique a matemática e, com a lei dos grandes números, exercite prever o futuro. Sorte! Boa sorte!

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