Opinião: reminiscências de uma amiga prostituta

Imagem: Autorretrato com Colar de Espinhos e Beija-flor - Pintura de Frida Kahlo

A jornada da vida é recheada de mistérios. Ninguém pode cravar, com toda certeza, o que os dias reservam, nem mesmos as surpresas das próximas curvas. Acredite quando eu digo que o homem, desde os primórdios, é movido por quatro estímulos: dinheiro, fé, vício e sexo. Guerras foram travadas em nossa história envolvendo, em essência, estes estímulos.

Como diz Morgan Housel… “pessoas de gerações diferentes, criadas por pais diferentes que ganharam rendas diferentes e acreditavam em valores diferentes, em partes diferentes do mundo, nascidas em economias diferentes, vivendo em mercados de trabalho diferentes com incentivos diferentes e graus de sorte diferentes, aprendem lições bem diferentes”.

Eu tinha acabado de completar 17 anos de idade e já cursava o primeiro semestre de faculdade. Ao finalizar a aula, seguia caminhando até a rua Alwin Schrader e fechava algumas agendas para o dia seguinte na escola de inglês que trabalhava e, perto da meia-noite, quando a sorte ajudava ganhava o transporte pago. Então aguardava um ônibus em frente a Rede Feminina de Combate ao Câncer, na rua Itajaí.

Ali era o “ponto” de uma mulher que encontrou no sexo a forma de garantir o sustento. Ficamos amigos. Ela esperava um cliente e contava suas histórias. “Quem sabe um dia você não me entrevista”, disse certa vez dividindo memórias e uma garrafa de refrigerante.

Como eu trabalhava com vendas, e tinha uma dificuldade enorme de fechar um contrato, ela fazia piada: “meu produto vende melhor que o teu, menino”. O tempo passou… assim como ocorre com todos os amigos nós também perdemos o contato.

“Enquanto a mariposa só voa à noite e a borboleta só voa de dia, a borboleta social voa tanto de dia quanto de noite. Ela é universalmente desprezada e condenada e quase universalmente invejada: um dos mais estranhos dentre os muitos fatos estranhos da história natural. Ela vive com um único propósito, o de manter-se constantemente em movimento”.

Arnold Bennett traduziu o transitar nas camadas da sociedade. Penso que é o que buscamos todos. Das lições que recebi ao longo dos dias que dividi um tempo com a amiga prostituta, ficaram para vida a força de fazer, sem pudor, o que for possível para construir mais qualidade para os seus.

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