Opinião: combustíveis elegem e derrubam presidentes

A história brasileira aponta para uma especialização, quase uma vocação nacional: não dar certo. Mas, isso não é por um acaso do perverso destino. As decisões equivocadas, para dizer o mínimo, fazem do Brasil um profissional em errar o caminho. Parece que, como povo, gostamos desta confortável roleta. Chega ser irritante! O momento atual, de crise global de energia e fertilizantes, torna visível a falta de compromisso nacional com o longo prazo. E não se engane com os discursos eleitorais em 2022, caminhamos para repetir os mesmos debates e soluções. Nesta semana acordamos com o maior aumento dos combustíveis da nossa história. Culpa dos brasileiros!

Precisamos compreender que não é possível construir um país desenvolvido, rico nas mais diversas áreas, sem encontrar um norte capaz de unir os diversos pensamentos. Formar uma base intocável que atravesse o mandato de diversos presidentes. Foi assim que fizeram as maiores potencias que atingiram um alto nível de progresso.

É possível, não é fácil, mas dá para chegar lá. A China, por exemplo, levou menos de 30 anos para sair da miséria para liderança econômica global. Conformar-se que gerações futuras serão beneficiadas com o sacrifício deste tempo é um passo. Encontrar pessoas com capacidade de dialogar com todos os lados é fundamental.

Um dia existiu um presidente que bradou que “o petróleo é nosso”. Somos, de fato, autossuficientes em extração desta commodity do solo. Ou seja, retiramos do chão mais do que precisamos para o uso interno. Mas, hoje produzimos menos derivados de petróleo que há 10 anos atrás. Ampliamos o consumo de gasolina, diesel, gás natural, filmes plásticos e reduzimos a capacidade de gerar, em território brazuca, estes e outros produtos derivados.

Sabe as escolhas que escrevi no início do texto? Pois é, este é um exemplo. Optamos em importar, depender de outras pátrias, no lugar de pagar o preço de ampliar a eficiência local. Na última década, apenas a Petrobrás vendeu mais de 50 plantas e negócios que ofereciam ao país a chance de mitigar os efeitos de variação e escassez de resultantes da commodity. Processo intensificado no governo atual.

A situação de falta de um olhar mais a diante não é exclusividade do setor de energia, especialmente as fósseis. Talvez seja um resquício de nossa origem pois, desde a chegada de Pedro Álvares Cabral, o entreguíssimo é recorrente e pouco reflexivo. Ficando apenas no período pós-redemocratização, tivemos desde a venda da Vale à diluição de diversos negócios estratégicos para o país. E este não é um texto contra as privatizações. Porém, devemos ter a clareza que ao passar a autonomia para longe das mãos verde e amarela também ficamos reféns, com pouquíssimas opções para solucionar os problemas que surgem. Imprevistos são as únicas coisas que você pode ter certeza que vão “acontecer”.

Assim como ocorreu com os derivados de petróleo, que reduzimos nossa capacidade de produção, derrubamos a fabricação de fertilizantes. O Brasil é a principal fronteira agrícola de mundo e um dia foi também autossuficiente em produção de fertilizantes.
Na última década encolhemos ao ponto de hoje não ter opção para garantir um biênio de boas safras. Curioso é que no início de fevereiro o presidente da república comemorou a venda de mais uma estatal que produzia fertilizantes para nossas lavouras. Mais uma vez, não é por acaso. Escolhemos pagar o preço que um estrangeiro resolver impor.

Eu poderia continuar nesta toada listando uma série de exemplos que diminuem as possibilidades de autonomia e retomada econômica brasileira. Afinal, apenas nos últimos três anos extinguimos as reservas estratégias de combustíveis, de alimentos. Torramos boa parte das reservas cambiais. Vendemos portos e aeroportos, cortamos investimentos em pesquisas, inclusive agrícolas. Ficamos mais dependentes da boa vontade do mundo.

A verdade é que formamos uma pátria amada paciente. E poucas coisas revoltam os brasileiros. Historicamente os combustíveis são responsáveis por eleger e derrubar governos. Um fato incontestável desde o momento que o petróleo passou para lista das necessidades básicas para humanidade. E vou além: a sensibilidade do eleitor a tudo que envolve veículos – de mobilidade, transporte a posse material – é estabilizador de civilidade. Algo não exclusivo nosso. Como disse certa vez Barack Obama, “nada é capaz de acabar com a paciência dos eleitores como gasolina cara”. Resta saber se desta vez, por aqui, será diferente!

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