Precisamos continuar falando sobre suicídio

Suzana Sedrez Psicóloga

Dra. em Educação, Mestre em Ciências Sociais

 

Émile Durkheim (1858- 1917), primeiro estudioso sobre suicídio, afirmou que há uma tendência específica para o suicídio, em cada grupo social, determinada por causas sociais de um fenômeno coletivo.

Sua questão era como essas causas se individualizam para provocar suicídios. Sua pesquisa definiu três tipos de suicídio: egoísta, altruísta e anomico, cujo traço comum é o da personalidade individual desvalorizada dentro de um estado, segundo ele, de “alarmante miséria moral”.

O Brasil é o 8° País de suicídios no mundo. Estima-se que sejam 800 mil por ano, ou seja, cinco suicídios para cada 100 mil habitantes. Há estatísticas que o apontam como a 2º causa de morte, cujo índice maior encontra-se no Rio Grande do Sul.

Em Santa Catarina, o nível elevado está em Luís Alves. Notícias apontam uma estreita relação entre depressão e uso de agrotóxicos no meio dos agricultores, nesses locais, em especial.

Os estudos atuais afirmam que 90% dos casos poderiam ser evitados e já é considerado um problema de saúde pública. Concluem que é um fenômeno multicultural e tem suas causas no tipo de sociedade e nas transformações que a impulsiona, como apontou Durkheim no século passado.

Desde então, cada vez mais, a sociedade intensificou o processo de fazer as pessoas adoecerem porque instiga padrões inalcançáveis. A decepção advém quando não conseguem realizar todos os seus desejos. O sujeito sente-se isolado e perdido pelos padrões de publicidade. É culpabilizado porque não teve força para resistir. Então, tudo pode acontecer: até o suicídio…

O suicida se identifica com a sua dor num vazio insuportável. A vida é dor e é preciso parar com ela. Sair da consciência. Sair de si. Sair da vida que o sustenta.

Geralmente é uma pessoa solitária mergulhada em meses e anos de sofrimento e quer matar o sofrimento que a mata que resulta num gesto de comunicação violenta e um desejo enorme de ir para um lugar melhor a procura de paz.

Quem se suicida tem história de sofrimento da qual quer se livrar e só vê uma saída. No geral, essas pessoas apresentam algum distúrbio afetivo e a aposta é a de que falar salva a partir de acolhimento e de ajuda profissional.

Atitudes para com a pessoa que esteja nessa situação limite: estimular novas razões para viver; ser ouvido e aceito; ser compreendido para se sentir digno. A terapêutica adequada é ouvir esse outro para escutá-lo… promovendo aceitação e compreensão para o desenvolvimento da confiança e aquisição de resistência contra a doença do desespero.

Alento para quem perdeu em ente querido nessa situação: reconstruir o luto é refazer as relações que se revelam apenas após a perda. É descobrir do que eram feitas tais relações para ativamente deixar que o outro nos deixe, incorporando algum traço significativo deste.

Em todos os casos o sentimento é de desamparo. Remete a sucessivas experiências de abandono na infância. Por isso é importante viver as etapas da lamentação porque elas mostram perdas de imagem e de identidade. Assim, o outro precisa reconhecer o sofrimento de quem o experiencia, numa perspectiva ética para avançarmos enquanto sociedade fraterna.

A ética é uma narrativa cultural de sentido da existência. Nela nos perguntamos sobre o que a vida é? O que deveria ser? O que queremos dela? Especialmente porque vivemos hoje no mundo da imagem em que estão disponíveis falsas certezas e muito espetáculo, fama instantânea, narcisismos, hedonismos e infantilização do sujeito.

Outra ética, para uma cidadania solidária, se constitui numa reflexão crítica da moral vigente. Nessa reflexão, se denuncia a moral opressora e dominadora, sobretudo, porque a ética resulta de práticas e de relações sociais vigentes. A nossa ética se diferencia de acordo com nossa relação com o outro. Desta forma, a ética se constrói a partir de discursos e narrativas para sentido da existência humana e da natureza como um todo.

A cidadania pode ser compreendida enquanto um conjunto de princípios que traduzem relações sociais de “tipo novo” que norteiam as ações de pessoas, grupos, para conquistar acesso a direitos básicos que garantam a vida em sociedade para qualquer indivíduo nas formações sociais, cuja materialidade é resultado de conquistas públicas e sociais. Daí ser a vida responsabilidade dos que vivem em sociedade, ou no dizer de Sartre: “O essencial não é o que se fez do homem, mas o que ele faz daquilo que fizerem dele”.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será divulgado.


*