No mês da consciência negra, vamos falar de branquitude

Carlos Silva

Professor Universitário, membro da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN)

 

Antes de qualquer coisa, quero “bater cabeça” aos(as) mais velh@s, aos(as) mais nov@s, aos meus iguais e a toda ancestralidade negra. Este gesto ritualístico é comum nas religiões de matriz africana e é um sinal de respeito aos ancestrais e às pessoas mais velhas. Além disso, “bato cabeça” ao Kwè Vodun Òtoòlú Hundê (casa que frequento em Blumenau).

No mês da consciência negra, precisamos falar sobre branquitude ou branquidade e os privilégios sociais, políticos, econômicos e as tomadas de decisões na esfera do poder por aqueles e aquelas que nunca quiseram ser nomeados pela cor, se autodenominando como “raça” humana, algo universal, homogêneo. Quem tem cor e “raça” são os outros: negr@s, indígenas, asiáticos, aborígenes…

Para começo de conversa, não trato “raça” aqui no sentido biológico e sim como um discurso social e político que está relacionado com a estrutura de poder. O europeu branco precisou justificar o sistema escravocrata e inventou esta palavra para hierarquizar a ideia de superior e inferior, inclusive cientificamente com estudos sobre eugenia. E por muitos séculos os indivíduos foram classificados em cor e racializados, mas nem todos, um grupo ficou de fora destas discussões.

Foi preciso a intelectualidade negra estudar sua própria cultura, sua ética, sua estética, sua religiosidade e seu saber e dizer aquilo que não era dito, qual seja: o discurso da branquitude (branquidade) e os seus privilégios. Passa-se a discutir, então, um projeto de sociedade o que, aliás, causa um desconforto nas cabeças conservadoras e colonizadas da classe média branca, heterossexual e cristã. O pano de fundo disso tudo são as políticas públicas para atender os desiguais e quebrar o discurso de igualdade.

Enquanto os negr@s reivindicam políticas de promoção de igualdade racial, os brancos se fecham na defesa de seus privilégios e odeiam que se fale em racismo estrutural, sistêmico e institucional. Mesmo com números apresentados pelos institutos apontando que a educação de qualidade não chega aos pretos e pardos deste país. E nesta escola branca não se estuda, por exemplo, a mitologia e os saberes africanos. Os autores são europeus, não são africanos, e os intelectuais negros são invisibilizados.

Só para saber. A política de cotas de terras (durante e pós abolição), de bolsas de estudos nas universidades públicas, e até mesmo no exterior, nunca foram questionados, mas bastou serem aplicadas as ações afirmativas como estratégia de reparação social e econômica, aí surge o conflito, o discurso da igualdade e os ataques de quem quer manter seus privilégios em todos os setores da sociedade.

Quando se faz o retrato da miséria no Brasil, ela é preta, o contingente de encarcerados nos presídios e nas penitenciárias: também é preto; das mulheres que sofrem violência doméstica, desrespeito no mercado de trabalho, abandono, aborto clandestino… é preto. As políticas públicas são privilégios de homens e mulheres brancos. Ao homem negro sobram algumas vantagens, enquanto para mulher negra muitas vezes nem isso. No mês

da consciência negra, o que precisamos debater são os privilégios branco que estão estampados num congresso nacional, numa câmara de vereadores, numa assembleia legislativa, num judiciário e num executivo que são espaços de poder e de tomada de decisões.

Para reverter este sistema, precisamos de mais consciência negra (cultura, religião, estética, ética, moral e o saber) todos os dias, a todo instante, com engajamento de negr@s e não negr@s. Só assim começamos a apagar os rastros do sistema escravocrata que ainda estão muito visíveis neste país das desigualdades.

Enquanto isso, bato cabeça aos mais velhos(as), à nossa ancestralidade e vamos procurar saber de nossa história para reescreve-la.

1 Comentário

  1. Brancos, pardos ,negros e índios tem o mesmo direito no Brasil , existem pobres e ricos
    de todas as raças . Se o autor observar , a maioria dos jogadores brasileiros que ganham
    muito bem são negros ou pardos e assim em todas as profissões . O que temos que parar
    é com a consciência de diminuição pessoal. Pretos , brancos, pardos , índios , amarelos,
    seja a cor e raça que for , se não buscar seu espaço sempre será a minoria esperando
    favores travestidos em direitos de raça . Nasci branco e pobre, em uma família de 7 irmãos ,
    nem por isto fiquei choramingando nos cantos, fui a luta , busquei meu espaço . O racismo
    não é da cor ou raça , é de pensamento .

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